Um estudo para determinar a fonte de detecção da hepatite C no Brasil Realizada pelo Grupo Otimismo

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Resumo

Poucas informações estatísticas existem sobre a hepatite C no Brasil. Os dados oficiais são falhos, não existe um fluxo definido claramente quanto às responsabilidades na notificação dos casos nem controle sobre as informações. A pesar de se tratar de uma doença de notificação compulsória os números disponibilizados pela Secretaria de Vigilância Epidemiológica com 7.998 casos notificados para todo Brasil no ano de 2005 são irrisórios demonstrando a sub-notificação existente no país.

Ante a inexistência de dados que respondam à questão daquilo que é considerada a “porta de entrada” no diagnostico, a presente pesquisa realiza uma analise retrospectiva nos pacientes já detectados, pesquisando por meio eletrônico como se deu o diagnostico da doença e qual o conhecimento sobre a mesma, antes e após seu diagnostico.

Devido ao elevado numero da amostra, com a participação espontânea de 1.629 indivíduos os dados, apesar de só incluir entrevistas por meio eletrônico refletem a realidade da situação encontrada, compensando qualquer distorção por classes sociais ou facilidade de acesso a internet.

Métodos

Foi solicitado aos associados do Grupo Otimismo de Apoio ao Portador de Hepatite que voluntariamente e anonimamente respondessem nove questões preparadas especialmente para a pesquisa. As entrevistas foram anônimas e somente a cidade de moradia, a qual será utilizada para futuros estudos, foi solicitada.

Participaram espontaneamente 1.629 indivíduos respondendo a nove quesitos, alguns deles colocados estrategicamente para confirmação do conhecimento da hepatite C e da qualidade da resposta.

A primeira questão tentava responder se o individuo tinha conhecimento de alguma campanha do governo divulgando ou alertando sobre a hepatite C.

A segunda questão pesquisou o nível de informação dos já diagnosticados perguntando se os familiares já tinham sido testados para a hepatite C, conforme recomendam todos os consensos sobre a doença.

Quatro perguntas estavam relacionadas aos Centros de Testagem a Aconselhamento, os chamados CTA, objetivo do Programa Nacional de hepatites Virais para serem utilizados como locais de testagem para a população. Para tal foram elaboradas perguntas onde se solicitava informar sobre o conhecimento da existência de algum CTA; para se saber se já tinha presenciado a existência de algum cartaz informando sobre a possibilidade de realizar o teste de detecção no CTA; se pessoalmente já conhecia o endereço do CTA e finalmente se sabia qual a função do CTA.

A sétima pergunta tentava por meio de ela identificar se o participante da pesquisa era freqüentador de um posto de saúde, unidade básica de saúde ou hospital público. Para tal, com três possibilidades de resposta foi possível efetuar o calculo percentual de usuários do sistema de saúde pública que participaram da pesquisa.

A oitava pergunta indagou sobre o motivo que levou o participante a realizar o teste da hepatite C e, na nona e ultima questão os participantes indicaram o local onde o teste foi realizado.

Resultados

PERGUNTA NÚMERO 1) Você já viu alguma campanha do governo divulgando ou alertando sobre a hepatite C?
ATENÇÃO: A formulação desta pergunta foi revista e ampliada quando foram recebidos e-mails afirmando ter vistos filmes publicitários com os atores Cissa Guimarães, José Wilker, Cristiana Oliveira, Patrícia Pillar e Miguel Falabella e, também, o do “Bichinho Verde” pensando se tratar de anúncios governamentais. Assim, a partir dos 500 participantes foi incluído um esclarecimento dentro da pergunta, esclarecendo que todos esses filmes eram de autoria do Grupo Otimismo.

O resultado foi claro ao mostrar que na população em geral 114 (7%) pessoas já observaram ou tiveram conhecimento de algum tipo de propaganda governamental alertando sobre a hepatite C, contra 1.513 (93%) dos participantes que nunca observou nenhum alerta sobre a doença realizado pelo governo.

PERGUNTA NÚMERO 2) Se você é portador da hepatite C, seus familiares já fizeram o teste para saber se estão infectados?

Em relação à necessidade da família ou parceiros dos infectados com a hepatite C realizarem, também, o teste de detecção, conformem recomendam os consensos, foi encontrado que 532 (33,2%) dos casos detectados a família ou os parceiros ainda não foram testados. Um resultado preocupante demonstrando que as recomendações de consenso sobre a necessidade de testar a família não estão sendo seguidas.

PERGUNTA NÚMERO 3) O teste de detecção das hepatites B e C pode ser realizado em alguns dos chamados Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA). Você sabe se na sua cidade existe algum CTA?

De um total de 1.625 respostas relativas a esta pergunta, 377 (23,2%) sabem que na sua cidade existe um CTA (Centro de Testagem e Aconselhamento) sendo desconhecida sua existência para 1.248 (76,8%) pessoas.

PERGUNTA NÚMERO 4) Já viu algum cartaz ou anúncio informado onde fica o CTA?

Um total de 1.536 (94,6%) pessoas informaram nunca terem visto qualquer cartaz ou anuncio em hospitais ou postos de saúde informando o endereço do CTA. Somente 87 pessoas (5,4%) responderam afirmativamente.

PERGUNTA NÚMERO 5) Sabe o endereço onde fica o CTA da sua cidade?

Dos 377 que afirmaram saber da existência somente 254 conhecem sua localização. Do total, 1.359 (84,3%) pessoas não sabem onde se localiza o CTA.

PERGUNTA NÚMERO 6) Você sabia o que é um CTA, qual a função dele?

De um total de 1.616 respostas a esta pergunta, 396 (24,5%) sabem que um CTA é um centro de testagem, contra 1.220 (75,6%) que desconhece qual e a sua função.

PERGUNTA NÚMERO 7) O posto de saúde ou o hospital que você freqüenta realizam testes de detecção das hepatites B e C a quem o solicitar?

Esta pergunta foi realizada para tentar identificar a origem dos indivíduos participantes da pesquisa. É observado que 585 (36%) pessoas souberam responder se o posto de saúde ou hospital que ele freqüenta realiza testes de detecção, indicando que estes podem ser pacientes que são atendidos no serviço publico. 1.040 (64%) não souberam informar, indicando que freqüentam consultórios e hospitais particulares.

Entre os 585 que souberam responder, 354 (60,5%) informaram que os testes são feitos nesses locais públicos, contra 231 (39,5%) que informaram que não são realizados.

PERGUNTA NÚMERO 8) Como foi que você recebeu a indicação para realizar o teste de detecção da hepatite C?

De um total de 1.541 respostas, 914 (59,3%) realizaram o teste de detecção por solicitação após a realização de uma consulta médica; 168 (10,9%) por indicação de uma outra pessoa; 70 (4,6%) por um alerta recebido por meio de alguma atividade realizada por uma ONG e, 389 (25,2%) realizaram o teste ao efetuar uma doação de sangue, de forma espontânea, sem procurar especificamente por um teste de hepatite.

O resultado mostra que 74,8% das pessoas procuram à realização do teste e 25,2% foram diagnosticadas ao realizar uma doação de sangue.

PERGUNTA NÚMERO 9) O teste de detecção da hepatite C foi realizado em que local?

De um total de 1.553 respostas a esta pergunta, 1.033 (66,5%) realizaram o teste de detecção da hepatite C em laboratório particular; 134 (8,6%) foram detectados em hospitais públicos; 57 (3,7%) em postos de saúde (unidades básicas de saúde); 28 (1,8%) nos Centros de Testagem e Aconselhamento – CTA e, 301 (19,4%) confirmaram a hepatite C nos próprios bancos de sangue onde espontaneamente realizaram uma doação de sangue.

Conclusões:

A pesquisa eletrônica totalizando um universo médio de 1.550 participantes apresenta de forma inédita pela primeira vez no Brasil um quadro real sobre a detecção da hepatite C mostrando qual foi o caminho escolhido para se chegar à detecção da doença.

É necessário considerar que as camadas mais humildes da população possuem acesso limitado à internet, assim, uma pequena distorção poderá existir em relação ao quadro geral, mas pelo elevado número de participantes e o resultado da pergunta de número sete o resultado apresenta uma assertividade muito próxima da realidade.

A mínima detecção nos chamados CTA – Centros de Testagem e Aconselhamento confirma o resultado encontrado pela Comissão de Monitoramento do Programa Nacional de Hepatites. Esta comissão, formada por representantes das associações de pacientes realizou um levantamento detalhado dos CTA, verificando que o desconhecimento deste serviço e grande na população em geral, e, sua abrangência muito pequena já que são encontrados em somente 200 dos quase seis mil municípios brasileiros.

Até pouco tempo atrás era verificado nos hospitais de atendimento referenciados para o tratamento das hepatites que a maior procura por atendimento para tratamento da hepatite C era originada pela detecção espontânea realizada nos bancos de sangue ao se efetuar uma doação. Hoje o banco de sangue representa apenas um em cada quatro indivíduos detectados.

O quadro do diagnostico foi invertido e hoje a detecção após uma consulta representa 59,3% dos detectados. Ao se confrontar este dado com o local onde foi realizado o teste o mesmo se confirma ao se verificar que a detecção nos laboratórios particulares representa 66,5%. A diferença de seis por cento a mais ao se comparar a consulta com o laboratório particular e devida a confirmação do teste por indivíduos que receberam um primeiro diagnostico numa doação de sangue e que confirmam o resultado num laboratório particular.

Ao se constatar que entre os que realizaram o diagnostico em laboratórios particulares e bancos de sangue representam 84% dos portadores, podemos verificar, tristemente, que somente 16% dos infectados realizou a detecção num hospital público, ou posto de saúde ou CTA um resultado que sugere que as camadas menos favorecidas da população, os mais pobres, não estão sendo detectados.

O aumento da procura do teste de detecção durante a consulta médica deve ser atribuído ao foco das campanhas realizadas nos últimos três anos pelas ONGs, sejam elas por meio de cartazes, folders e anúncios na TV, sempre com a recomendação expressa de “na próxima consulta fale com seu médico sobre a conveniência de realizar o teste de detecção“.

A indicação “na próxima consulta“, utilizada pelas ONGs nas suas campanhas parece ser o caminho correto para incentivar a detecção da hepatite C, um caminho que os resultados mostram que deve ter continuidade e maior ênfase em toda campanha ou peça publicitária que tenha como objetivo alertar a população sobre o grave problema que representam as hepatites e a importância do diagnostico precoce.

Carlos Varaldo
www.hepato.com
hepato@hepato.com 


IMPORTANTE: Os artigos se encontram em ordem cronológica. O avanço do conhecimento nas pesquisas pode tornar obsoleta qualquer colocação em poucos meses. Encontrando colocações diversas que possam ser consideradas controversas sempre considerar a informação mais atual, com data de publicação mais recente.


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