2016, um ano bom para as hepatites

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Estamos chegando ao final do ano e no atendimento as hepatites conseguimos vários avanços e conquistas para comemorar, assim como surgem novos desafios para 2017. A seguir meu comentário pessoal em cada assunto para Brasil, América Latina e Europa.

1 – BRASIL

HEPATITE C

Na hepatite C foi o ano em que teve início o tratamento com os medicamentos de ação direta, livres de interferon e totalmente orais. Em 2015 o ministério da saúde tinha prometido que estaria distribuindo 30.000 tratamentos em 2016 e 45.000 em 2017, mas em julho o governo antecipou a meta de 2017 e conseguiu distribuir 45.000 tratamentos em 2016. Para quem estava acostumado a tratar 15.000 por ano com interferon peguilado ter triplicado o número de pacientes tratados é um avanço indiscutível, são poucos os países que ofereceram tratamento a 45.000 infectados em 2016.

Por ser economista gosto de números e ao analisar os números vemos que com interferon foram tratados uns 100.000 infectados em 10 anos, desses uns 40.000 ou até 50.000 resultaram curados e outros lamentavelmente já estão mortos, assim, o “estoque” de não respondedores a tratar com os novos medicamentos pode ser estimado em uns 40.000 e todos eles estão recebendo os novos medicamentos. Ainda, entre 40.000 e 50.000 novos diagnosticados foram encontrados entre 2015 e 2016.

Considerando que na primeira oferta de tratamentos, tal qual outros países, a decisão foi de priorizar tratar os pacientes mais graves, isto é, os com fibrose F3 e F4 (cirrose) e considerando que 42% dos diagnosticados se encontram nesse nível da doença, é fácil calcular que os novos diagnosticados a serem contemplados conforme o protocolo são aproximadamente uns 19.000 os quais somados aos 40.000 não respondedores ao interferon formam um universo de aproximadamente 60.000 infectados a serem tratados.

Com a distribuição em 2016 de 45.000 tratamentos e com a entrega prevista para março de uns 20.000 tratamentos (já no estoque do ministério) praticamente todos os F3 e F4 já diagnosticados serão atendidos.

É praticamente seguro que em 2017 serão contemplados os infectados com fibrose F2 (estamos lutando por isso), mas curiosamente, os infectados com fibrose F2 são aproximadamente a metade daqueles com fibrose F3 e F4, entre 18% e 22%, assim, serão necessários uns 25.000 tratamentos, no máximo 30.000.

Então, quantos tratamentos o ministério da saúde deverá comprar em 2017 caso não aumente o número de novos diagnosticados? Uma pergunta que não sei responder, mas então porque não passar a atender os infectados com qualquer grau de fibrose já a partir do final de 2017? Convoco todos a se unir para comprar essa briga e lutar para que isso se torne uma realidade e todos, sem importar o dano no fígado, recebam o tratamento.

Não concordo quando alguém alarma falando que existem dois milhões de infectados no Brasil e 130 milhões no mundo. Qual o objetivo disso? Podemos tratar quem não foi diagnosticado? Encontrar os infectados é a tarefa mais difícil que existe, a tal ponto que a Organização Mundial da Saúde na Assembleia deste ano estipulou como meta que até 2030, daqui a 13 anos, pelo menos 90% dos infectados estejam diagnosticados, uma meta que a maioria dos países certamente não conseguirá cumprir.

Ao se falar do número de infectados ainda não diagnosticados e se fazer cálculos de quanto custaria tratar todos ainda no próximo ano é um tiro no pé que é dado, pois assusta e nada resolve. Vamos falar sobre a realidade atual conforme acima analisado e tentar, isso sim, aumentar a cada dia a facilidade ao diagnóstico e ao tratamento.

Um esforço do ministério foi ter colocado os testes rápidos em todos os postos e unidades de saúde do Brasil todo. A recomendação é oferecer e realizar o teste nos postos ou unidades de saúde a todos os pacientes, pois se o resultado for positivo existe um fluxo para dar continuidade aos testes confirmatórios e se necessário ao tratamento. Fazendo o teste rápida na rua, sem apoio das secretarias da saúde, vemos frequentemente que os resultados positivos são largados a própria sorte do indivíduo, sem saber a quem recorrer, se configura um verdadeiro crime, diagnosticar e não tratar.

HEPATITE B

Passando para a hepatite B fechamos o ano com a publicação de um novo Protocolo de tratamento onde foi introduzido o interferon peguilado e da como escolha de tratamento o entecavir e o tenofovir e, pela primeira vez, contemplando os infectados com hepatite Delta (D).

Também, a vacina da hepatite B passou a estar disponibilizada gratuitamente a todo e qualquer cidadão, sem limite de idade.

INCORPORAÇÃO DE MEDICAMENTOS E NOVAS TECNOLOGIAS

No início de dezembro participei da reunião comemorativa dos cinco anos da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologia no SUS, a CONITEC, e curiosamente a primeira decisão da CONITEC em 2012 foi referente as hepatites, decidindo pela incorporação dos inibidores de proteases boceprevir e telaprevir e, fecha agora o ano de 2016 publicando o novo protocolo para tratamento da hepatite B. Não somente a primeira e a última decisão foi referente as hepatites, como na reunião comemorativa a qual fui convidado a participar as hepatites eram sempre colocadas como exemplo já que seus protocolos são aceitos pela totalidade dos profissionais da saúde, o que não acontece totalmente em outras doenças. A forma como o Departamento DST/AIDS/Hepatites colabora com a CONITEC é um exemplo que deveria ser seguido por outras patologias.

GERENCIA DE HEPATITES NO DEPARTAMENTO

No mês passado o gerente de hepatites do Departamento DST/AIDS/ Hepatites do ministério da saúde solicitou sua demissão, uma pena, pois era um funcionário de altíssimo conhecimento técnico e científico. Começou uma seleção, um excelente candidato estava quase certo, quando chego a ordem de não poder se contratar mais nenhuma pessoa dentro do ministério devido a crise. Voltamos na estaca zero e agora a solução deverá ser promover um funcionário do departamento.

OBJETIVOS DE LUTA PARA 2017

1 – Certos de que os infectados com hepatite C com fibrose F2 passarão a ser contemplados mais tardar em julho, lutar para que os com fibrose F1 sejam contemplados até o final do ano ou início de 2018.

2 – Continuar a pressionar para que os medicamentos deixem de ser considerados “excepcionais” e passem para estratégicos, para que passem a ser distribuídos pelo mesmo fluxo dos medicamentos para AIDS, pelo SICLOM.

3 – Que os medicamentos para hepatite B, em especial o tenofovir, possuam o mesmo estoque nos almoxarifados. Nunca falta tenofovir para AIDS, mas continuamente falta para o tratamento da hepatite B. Parece que existem dois Brasis dentro de cada hospital.

4 – Convencer todos os profissionais de saúde, sejam do SUS ou particulares, a oferecer em cada consulta o teste das hepatites B e C.

5 – Negociar com a Agencia Nacional da Saúde – ANS – para que pelo menos alguns planos, individuais e empresariais, se envolvam no diagnóstico da hepatite C.

6 – Trabalhar a meta de Organização Mundial da Saúde para que em 2030 as hepatites B e C sejam doenças de baixa prevalencia e possam ser consideradas doenças raras no mundo.

MUDANÇAS NA MINHA ATUAÇÃO E NO POSICIONAMENTO DO GRUPO OTIMISMO

Muitos se surpreendem que Carlos Varaldo esteja batendo palmas e reconhecendo a atuação do ministério da saúde do Brasil. Desde 1999 e durante muitos anos reivindiquei, reclamei, denunciei, organizei manifestações de protesto e abri 32 procedimentos no Ministério Público, isso até me custou alguns processos aos quais tive que responder na justiça e na Polícia Federal, mas isso é passado e nos últimos três anos reconheço os avanços e por isso trabalho de mãos dadas com o ministério e o Departamento.

O avanço na hepatite C é evidente e na B a solução além de tratar é vacinar a população toda, a oferta da vacina está sendo efetivada, falta cada cidadão procurar o posto ou unidade de saúde.

Espero que compreendam minha mudança, mas quando observo que esses 17 anos de luta estão dando resultados não podemos ser radicais xiitas para não enxergar a nova realidade no enfrentamento das hepatites.


 

2 – AMÉRICA LATINA

É extremamente difícil colocar um panorama de como anda o enfrentamento as hepatites B e C nos países da América Latina e Caribe já que em cada país é uma realidade totalmente diferente.

Sem querer nomear país a país é triste ver que alguns países nem sequer oferecem tratamento gratuito aos infectados, nem com interferon ainda, outros só cuidam da hepatite B e não da hepatite C, outros somente tratam a hepatite C se a pessoa é coinfectada com HIV (AIDS), outros não têm na estrutura da saúde nenhuma área cuidando das hepatites.

Por outro lado, é estimulante ver que Argentina começou a oferecer tratamentos, ainda de certa forma incipiente, mas já é um alento, também, é bom ver que países como Chile, Colômbia, México, Peru e Uruguai estão discutindo formas de adquirir os medicamentos para tratamentos gratuitos. Pode ser que em 2017 tais discussões resultem em resultados práticos e os infectados passem a ser tratados.


 

3 – EUROPA

Em relação a Europa reproduzimos parte do estudo “Hep-CORE Report” realizado pela ELPA – European Liver Patients Association – sobre a situação das hepatites em 27 países europeus que foi divulgado ontem, 20 de dezembro. ELPA é o grupo que reúne as associações de pacientes de toda Europa.

O “Hep-CORE Report” é o primeiro estudo importante realizado na Europa sobre as hepatites e mostra problemas graves nas políticas dos diversos países.

Conforme os resultados, 52% dos 27 países (Europa e Mediterrâneo) não possuem estratégias nacionais para enfrentar as hepatites B e C. Somente três países oferecem os novos medicamentos orai

s livres de interferon sem restrições. Entre os problemas mostrados no estudo, 17 países não possuem registros sobre os casos de hepatite B e 15 países sem registro dos casos de hepatite C. Pior ainda, em 12 países (44%) o teste da hepatite C somente é realizada em hospitais.

A versão completa do “Hep-CORE Report” em espanhol é encontrada em: https://www.dropbox.com/sh/6hcwi2mhzwjp607/AADiTHN-lh8qyJx1t5aRTKaGa?dl=0&preview=Press+release+Hep-CORE+(ES).pdf


Finalizando, desejo a todos um Feliz Natal e um Prospero e Excelente 2017, com saúde e tratamentos.

Em 2017, curados ou não, vamos continuar juntos para vencer a guerra contra as hepatites!


Ficaremos em recesso até mediados de janeiro quando voltaremos com o mailing de notícias. Até lá!

Carlos Varaldo
www.hepato.com
hepato@hepato.com 


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